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FONTE: COMUNICAÇÃO CFC
Profissionais da contabilidade participaram de um seminário em São Paulo na semana passada para discutir um assunto relevante: a obrigação imposta à categoria de informar ao governo federal operações financeiras e comerciais supostamente ilícitas de seus clientes. A partir do ano que vem, contadores, auditores e organizações contábeis devem comunicar de forma eletrônica e quase que em tempo real ao Conselho de Atividades Financeiras e Econômicas (Coaf), ligado ao Ministério da Fazenda, as movimentações contábeis com indícios de lavagem de dinheiro ou suspeitas de estarem ligadas ao terrorismo.
A exigência tem causado polêmica no meio contábil e trouxe à tona a discussão sobre a quebra do sigilo profissional em relação ao cliente. Para convencer a categoria de que a legislação na prática vai blindar os bons profissionais, oConselho Federal de Contabilidade (CFC) – que baixou a resolução 1.445/2013, em que detalha as novas regras – tem promovido debates para esclarecer o assunto.
A ideia é também deixar claro que a imposição veio de cima para baixo e que coube ao conselho apenas regulamentar a matéria. Caso contrário, o assunto seria tratado isoladamente pelo Coaf, à revelia dos profissionais da contabilidade, sob o risco de imposição de regras incompatíveis com o exercício dessa atividade profissional. “A norma não traz qualquer prejuízo ao contador que possui uma conduta correta e exerce sua profissão com respeito, responsabilidade e ética. Vale destacar que a lavagem de dinheiro pode manchar a reputação, a confiabilidade dos serviços prestados e a credibilidade profissional”, afirma o vice-presidente de Desenvolvimento Operacional do Conselho Federal de Contabilidade, Enory Luiz Spinelli. A seguir, a entrevista concedida ao Diário do Comércio:
Diário do Comércio – Como convencer a categoria de que informar ao Coaf as operações duvidosas é diferente de denunciar os clientes? O que a entidade tem feito para essa conscientização?
Enory Luiz Spinelli – O contador, assim como as organizações contábeis, não são investigadores ou denunciantes das operações realizadas por seus clientes. O seu papel é de apenas informar possíveis operações ilícitas ao órgão. Vale lembrar que o Código de ética do contador ampara “o sigilo, o zelo, a diligência e a honestidade” em relação ao exercício da atividade lícita, e não nos casos ilícitos, como, por exemplo, na lavagem de dinheiro. Assim, o profissional está cumprindo o seu dever ao comunicar um ato indevido, do qual tenha participado ou tenha conhecimento. Para conscientizar sobre a importância da prestação de informações, o Conselho Federal de Contabilidade vem realizando diversas palestras sobre o tema em vários estados. O objetivo é chegar ao profissional por meio de seminários explicativos.
DC – Como o Conselho Federal de Contabilidade interpreta a inclusão dos profissionais do setor na lista de “informantes” do órgão federal de controle?
Spinelli – A resolução trata do cumprimento de uma Lei Federal de 1998, alterada em 2012. Informar tais casos ao Conselho de Atividades Financeiras e Econômicas (Coaf) é uma forma de proteger a utilização indevida da figura do contador que tenha participação ou conhecimento de atos ilícitos que lhe possam gerar sanções penais, além do risco de condicionar a imagem do profissional a organizações criminosas.
DC – Qual o ponto da resolução que mais tem gerado dúvidas no meio contábil?
Spinelli – Sobre quando e como informar ao Coaf. Uma das principais dúvidas é sobre o cumprimento da informação em 24 horas do fato ocorrido. Deve-se entender que o prazo de 24 horas refere-se ao momento que o contador tenha tomado conhecimento de um possível fato ilícito.
DC – Já se sabia com antecedência da participação da categoria no combate à lavagem de dinheiro ou o setor foi pego de surpresa?
Spinelli – Fomos pegos de surpresa quanto à alteração provocada na lei 12.683, de 2012. No entanto, a luta contra a lavagem de dinheiro é antiga. Com o objetivo de ampliar esse combate, foi editada no Brasil a Lei nº 12.683, em 9 de julho de 2012, complementando, de forma relevante, a Lei nº 9.613/98. Na ocasião, foram inseridos os profissionais e organizações contábeis no rol daqueles que devem prestar informações sobre operações suspeitas de crimes de lavagem de dinheiro e de outros ilícitos previstos na referida lei. Tal alteração mostra que o assunto não é uma novidade ou “modismo” criado no Brasil. Mas uma medida que faz parte do contexto mundial na luta para coibir as mais diversas atividades criminosas, arraigadas na economia.
DC- Em outros países, os profissionais da contabilidade também são essenciais no combate ao crime de lavagem de dinheiro? Há informações a respeito?
Spinelli – Sim. Desde a Convenção de Viena de 1988, os países signatários devem adotar medidas para tipificar como crime a lavagem ou ocultação de bens oriundos do tráfico de drogas e nas diretrizes do Grupo de Ação Financeira sobre Lavagem de Dinheiro escritas em 1990 e revisadas em 1996.
DC – A resolução foi publicada há bem pouco tempo. Como as regras estão sendo assimiladas pela categoria?
Spinelli – Os profissionais estão recebendo com certa surpresa, assim como todos os profissionais liberais incluídos na lei. O cumprimento da legislação que foi aperfeiçoada com o objetivo de combater o crime de lavagem de dinheiro deve ser entendido como um processo de mudança e que o contador deverá se ater para que não seja futuramente penalizado.
DC – Como os profissionais devem definir “possíveis operações ilícitas”, que carrega um forte grau de subjetividade?
Spinelli – As operações são consideradas suspeitas de acordo com os artigos 9º e 11º da Lei n.º 9613/1998 (regulados pelos artigos 1º, 9º e 10º da resolução do Conselho Federal de Contabilidade de número 1.445/2013). Ou seja, a participação ou envolvimento profissional em operação que aparente não ser resultante das atividades usuais do cliente ou do seu ramo de negócio, cuja origem ou fundamentação econômica ou legal não sejam claramente aferíveis, ou que seja incompatível com o patrimônio e com a capacidade econômica e financeira do cliente, entre outros aspectos.
DC – Recentemente, o Sescon- RS divulgou nota à imprensa em que repudia não apenas o formato da lei, mas a iniciativa do Conselho Federal de Contabilidade em elaborar a resolução. Como a entidade vê essa crítica?
Spinelli – Não se trata do Conselho Federal de Contabilidade (CFC), por sua iniciativa, elaborar a resolução 1.445/2013, mas na sua condição de órgão regulador da profissão cumpriu o que determina a lei para a aplicação dos dispositivos por parte dos profissionais e organizações contábeis. Ora, é possível notar-se que essa nova responsabilidade dos profissionais da área contábil não foi criada pelo CFC e que o conselho tampouco acatou de forma catequizada as disposições legais ao regulamentar a medida. Inclusive, o Conselho foi interpelado pelo Ministério Público Federal quanto ao cumprimento na regulamentação da lei. E preciso ficar claro que a Resolução nº 1.445/2013 conseguiu transformar a Lei nº 12.683/12 num instrumento de valorização profissional.
A norma não traz qualquer prejuízo ao contador que possui uma conduta correta e exerce sua profissão com respeito, responsabilidade e ética. Vale destacar que a lavagem de dinheiro pode manchar a reputação, a confiabilidade dos serviços prestados e a credibilidade profissional.
Escrito por Sílvia Pimentel